Poema: Sagrada

quinta-feira, abril 16, 2015

A Arte de Gilka Machado, por Ruth Campos

A Arte de Gilka Machado e a Expressão da Sensualidade da Mulher do Inicio do Século XX – Parte I

Sempre me chamou a atenção a forma como até bem pouco tempo a arte era a única forma de expressão e voz da mulher. A meu ver, a arte, mais especificamente neste caso: a poesia se tornava um modo legitimado destas, de poderem gritar aquilo que lhes atravessava a alma e a razão, de dizer a sociedade e especialmente aos homens que elas, que nós mulheres somos tão capazes quanto qualquer outro ser e bem mais que isso, que somos dotadas de desejos e peculiaridades só nossas.
Ao conhecer um pouco da história e obra da poetisa Gilka da Costa Mello Machado, imediatamente me encantei por ela e pela sua escrita que mesmo sendo sofisticada e rebuscada pelo seu caráter histórico, também é simples, corriqueiras e pertencentes ao universo de todos nós e isso dando um colorido todo especial a suas obras.
 
A poetisa, que ficou conhecida apenas por Gilka Machado, nasceu no Rio de Janeiro em 1893, carregava em seu DNA o amor e o gosto pela arte. Sua mãe, Thereza Christina Moniz da Costa, era atriz de teatro e de rádio-teatro. Na família havia vários poetas e músicos.
Ainda bem criança, Gilka começa a escrever seus poemas e com apenas treze anos de idade ela ganha três dos primeiros prêmios oferecidos pelo concurso realizado pelo jornal A Imprensa, usando seu nome e pseudônimo Regina de Alencar onde ela expressa toda a sua insatisfação com a sus condição de mulher privada do direito a sua legitima sensualidade.
 
Em 1910, a poetisa se casa com o crítico de artes, jornalista e poeta Rodolfo Machado e cinco anos depois, aos 22 anos de idade, Gilka publica seu primeiro livro de poesias Cristais Partidos.
O livro tem um total de 123 paginas e é iniciado com o seguinte poema, que vai dar a tônica do livro.
 
Em sua obra, Gilka explora o universo do simbólico, dos aromas, perfumes de flores, incensos, fazendo analogias e jogos de palavras com as sensações, os sentimentos e a sensualidade do ser mulher.   A poetisa chama logo a atenção por romper com aquilo que vinha sendo apresentado até então por outras mulheres na literatura, no lugar de uma escrita sofrida e adocicada, Gilka mostrava um estilo livre dos pudores predominantes na época causando desconforto e estranhamento na sociedade por se tratar de uma mulher casada e “mãe de família”.
Senti com Gilka a angustia de ser mulher e ter que muitas vezes provar a minha capacidade ou mesmo existir segundo ideais alheios a minha vontade.
Ser mulher..*
[...]Ser mulher, calcular todo o infinito curto
para a larga expansão do desejado surto,
no ascenso espiritual aos perfeitos ideaes...
Ser mulher, e, oh! atroz, tantalica tristeza!
ficar na vida qual uma águia inerte, preza
nos pezados grilhões dos preceitos sociaes!

A poetisa continua compondo e, em 1916, participa de uma conferencia onde apresenta uma coletânea chamada A Revelação dos Perfumes, onde chama muito a atenção pela forma como seus versos remetem a sexualidade e sensualidade da mulher, eis um trecho da obra:

[...]O perfume é um vaporoso pincel que ás vezes
vem traçar na tela da nossa memória os factos apagados
pela esponja do tempo.
Mas... caminhemos a noute. A Lua como uma
flor exótica da treva, nos ethereos jardins, abre a corolla
fria. Dormem as cousas, dormem as creaturas.
Ha por tudo a expressão intima do silencio. O luar,
qual um frouxel largo e longo, se desprende do céo
e tomba pelo solo.[...]

Em 1917, lança seu segundo livro intitulado Estados da Alma, cujo poema abaixo faz a abertura do livro, carrega seu titulo e concede seu tom.

[...] Quero me vêr no verso, intimamente,
em-sensações de gôso ou de pezer,
pois, occultar aqui Io que se sente,
é o próprio sentimento condemnar.
Que do meu sonho o branco véo se esgarce
e mostre núa, totalmente núa,
na plena graça da simpleza sua,[...]

Gilka Machado firmava-se como uma mulher a frente de seu tempo, que, por meio de seus poemas, lutava pelos direitos da mulher no campo politico social e também o seu livre acesso as representações do prazer erótico na poesia brasileira.  Identifico nessa mulher os ecos do que hoje conhecemos como movimento social feminista, que envolvia as mulheres no início do século, numa dor pungente e que como fios de uma teia invisível às impulsionava todas para o mesmo lugar passando por vias distintas deixando um grito escutado até os dias atuais e pela nova geração de mulheres como nos mostra o vídeo abaixo:
 
 
Ao conhecer um pouco mais da história de vida e da obra dessa mulher, me senti extremante tocada e imbuída do desejo de compartilhar com vocês, leitoras, um pouco do universo de Gilka Machado, mulher que além de poetisa estava à frente de seu tempo e ainda enfrentou o preconceito e o ostracismo social no qual as mulheres eram deixadas não se vergando frente aos ataques e críticas sofridas.
 
Até a próxima edição da coluna quando daremos sequencia a este tema. Sendo assim deixo a todos um grande abraço poético.
 
Sobre a colunista: 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Libriana apaixonada por tudo e amante de nada. Minha admiração está no meu  olhar que estranha e ao mesmo tempo acolhe, meu desejo é descobrir e  revelar o ser mulher em mim  e nas outras. 

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10 comentários:

  1. Bom, já havíamos falado desse texto e do quanto ele representa para literatura. A pesquisa é maravilhosa, informativa e reflexiva...
    http://www.poesianaalma.com.br/

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  2. Oi Lunna, eu já tinha visto este livro, até então desconhecido para mim, no blog da Lilian, achei bem interessante, e ainda acho, mostra o quão valente e a frente de seu tempo foi esta mulher, uma inspiração para muitas.
    Bjs, Rose.

    ResponderExcluir
  3. Ola tudo bem?
    Que linda esta obra, não conhecia, mas confesso que me interessei muito pela arte dela, vou pesquisar um pouco mais.
    bjs
    http://clubedabelezaemaquiagem.blogspot.com.br

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  4. nossa, não conhecia essa poeta. Fiquei bem interessada em ler os livros dela... Adorei os trechos que você escolheu para ilustrar o post. Gosto de histórias de mulheres fortes, que passaram por dificuldades e nunca desistiram de lutar para ser quem são.
    bjs

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  5. Meu Deus que mulher incrível! Me dá muita vergonha dizer que ainda não a conhecia.. esses versos já me tocaram, imagina então se conhecer o restante de sua obra? Obrigada por compartilhar esta riqueza conosco flor.. super beijo!

    Mutações Faíscantes da Porto

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  6. Eu não conhecia Gilka Machado, mas fiquei encantada ao descobrir mais coisas sobre ela aqui. Uma escrita maravilhosa, e uma personalidade forte que deveria ser mais conhecida.

    http://laoliphant.com.br/

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  7. Oi, tudo bem? Ainda não conhecia essa autora, mas fiquei apaixonada pelo jeito dela escrever. Suas poesias são escritas com a alma, tocantes e lindas ao mesmo tempo. Gostei muito do livro Estados da Alma, fiquei curiosa para ler. Ótimo post. Beijos, Érika

    www.queroseralice.com.br

    ResponderExcluir
  8. Belo trabalho de pesquisa histórica!
    Adorei conhecer mais sobre a vida e a arte de Gilka Machado.
    É muito bom saber que, não importando a época ou a forma, a mulher luta pelo seu espaço, e que isso vem sendo num amplo crescente.

    Boa semana!
    http://fabi-expressoes.blogspot.com.br/

    ResponderExcluir
  9. Olha isso Brasil!!!
    Essa mulher é pra aplaudir de pé!
    Ahazou no post :D

    Um beijo!
    SofiaPiassi.com

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  10. Oi, flor!
    Adorei a resenha. Não conhecia Gilka Machado e achei que a vida dela é, por si só, uma poesia. É difícil encontrar alguém que demarcou a história da nossa arte nessa época, sendo mulher e precisando lidar com as dificuldades que a cultura trazia. Adorei e fiquei bastante interessada na leitura.

    Beijos, flor!
    http://www.myqueenside.blogspot.com

    ResponderExcluir

O texto desta postagem foi produzido e elaborado por mim, Lunna Marcela e pensado em você cara leitora. Aqui tento colocar em palavras aquilo que me representa, que possa te alegrar e também representar de alguma forma. Deixe seu comentário pois ele é muito importante para mim....Bls Mil <3

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