Resenha: Os Poemas que Desisti de Rasgar, David Cohen
Em Poemas que desisti de rasgar, a ideia do poeta David Cohen é criar um paralelismo entre a frase de Guimarães Rosa "Viver é um rasgar-se e remendar-se" e o próprio fazer poético. De acordo com o autor, é inerente ao trabalho do escritor a primeira avaliação de sua obra, selecionando o que deve ser guardado e o que merece ser descartado. À semelhança da vida, o escritor, durante o processo criativo, se reinventa a cada palavra, rasgando e remendando seus textos, que posteriormente serão "rasgados e remendados" pelos olhos dos leitores. Por este motivo, Poemas que desisti de rasgar é um convite e uma provocação: o leitor dará a palavra final sobre o que deve permanecer.
Eram às 17 horas, quando minha mãe me chamou e me entregou uma encomenda que havia chegado pelos correios. Olhei desconfiada e curiosa. Abri o envelope e quando percebi que era o livro que eu estava esperando, rasguei o resto preservando apenas o presente que eu acabara e receber. Poemas que desisti de rasgar, de David Cohen, Editora Grupo 5W, 105 paginas.
Fiquei cerca de uma hora com o pacote rasgado do meu lado. Ora eu o pegava para sentir o cheiro de sorvete de baunilha que vinha de seu interior, ora eu estourava as bolinhas do plástico bolha que veio revestindo o envelope.
Quando enfim tomei coragem de pegar o livro, ainda demorei um bom tempo para abrir suas paginas com extremo cuidado, afinal de contas, eu iria entrar na alma de um poeta e haveria de se tomar muitas precauções, pois poderia deixar de ser eu a qualquer momento e não sabia se estava preparada para isso.
Alisei a capa e li seu título em azul brilhante; POEMAS QUE DESISTI DE RASGAR, de David Cohen, então aspirando mais uma vez o gostoso perfume de livro novo eu comecei a ler. Depois desse momento, me perdi no tempo, assim como previu o profeta David Cohen na pag. 49 do livro:
TURBULÊNCIA
Minha poesia é um voo sem escalas
Por uma zona de instabilidade.
Deve ser lida com fome
Com sede
Em um único fôlego,
Ao final do poema
Máscaras cairão automaticamente.
Nesse ponto, me acomodei melhor na cadeira, pois sabia que ia até a última pagina. Após terminar a leitura do livro, abri este documento para escrever esse texto a vocês, leitores.
O livro inteiro é uma agradável viagem pela mente do poeta e sentindo a cada linha o amor que ele sente ao escrever, assim como o respeito que ele tem pela sua arte. Em seus versos sobre as minúcias da vida, ele me levou a recordar pequenas aventuras da infância, como quando eu e meu irmão juntamos porcas, pregos, parafusos e pedaços de madeira em uma caixa e papelão para fazer um carrinho de rolimã, mas juntar o material foi mais emocionante do que despencar ladeira abaixo naquela geringonça. O meu irmão amou e repetiu a manobra inúmeras vezes!
Lembrei-me do gosto do açúcar com canela, as lambidas no bolinho de chuva ainda quente feito pela minha avó antes de enfim mete-lo inteiro na boca, da borboleta que morreu asfixiada dentro de um vidro de maionese, das flores que eu desenhava em todas as paginas dos meus cadernos quando criança.
Lembrei-me também de minhas próprias dores e angústias anotadas em quaisquer cupons, tão verdadeiras quanto o sorriso de um vendedor de sapatos em véspera de dia das mães.
Dei-me conta das tantas expectativas que depositamos na vida e estas, provavelmente, nunca virão ao nosso encontro. O autor demonstra intimidade e forte ligação com seus versos, como, por exemplo, no seguinte trecho:
PRECISO
[...] Um poema que me surpreenda.
Em madrugadas
Que conte segredos
Inconfessáveis
Que leia o braile
Dos pensamentos.
[...] Eu preciso de um poema
Que aprecie champanhe
E se embriague de palavras.
Trecho do poema Preciso, pag. 84.
Devo dizer que foi meu primeiro contato com o autor e que eu apreciei cada momento. Trata-se de uma Ode à arte de escrever poemas e poesias, é sobre se entregar sem reservas aos sentimentos e emoções, deixando fluir os versos e inversos da mesma história, ele também faz algumas menções a outros escritores como Guimarães Rosa e Carlos Drummond de Andrade, enfim é sobre ser poeta.
Sobre esta Obra Pedro Gabriel, autor do Livro Eu me chamo Antônio, assina a contra capa e diz assim; “David Cohen fez muito bem em desistir de rasgar seus poemas. Nós, leitores, teríamos um pouco mais de trabalho ao tentar juntar cada sílaba para encaixar com maestria a delicadeza das suas palavras”.
Só posso agora concluir essa resenha, dizendo o óbvio, que eu amei todo o livro e eu aposto que vão gostar dele tanto quanto eu caso vocês estejam preparados para ter suas memórias rasgadas.
Sobre o autor:
David Cohen é poeta e advogado. Em 2013, publicou seu primeiro livro de poemas, ‘Olho Nu’, pela Editora Verve. No mesmo ano passou a coordenar o sarau Da Boca Para Fora, na Casa da Leitura, dentro do Proler (Programa Nacional de Incentivo a Cultura). Teve poemas publicados em periódicos e antologias literárias, como a 10 vezes Literatura (Litteris Editora, 1999) e Poemas Cariocas 2012 (Ibis Libris, 2012). Em 2000, foi um dos organizadores do Grupo PraLavras, que se reunia semanalmente no Parque Lage para a declamação e produção de textos.
Resenhista: Ruth Campos
Lunna minha flor, que resenha incrivel,
ResponderExcluirfiquei toda arrepiada, é como se você tivesse mergulhado na alma do autor,
claro que como poetisa você bem entende o que se passa em nossas almas,
fiquei deliciada de ler cada palavra sua escrita sobre essa obra que merece ser lida
com muita dedicação, pois poemas são para serem lidos como se fossem oração.
Beijos e sucesso minha amiga.
Oiee jo que alegria saber que você gostou minha linda, então também me senti assim como se mergulhasse am algo muito profundo e muito gostoso..bjs espero ver vc aqui mais vezes .. <3
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